Precisamente há 80 anos, no dia 29 de Outubro de 1936, chegava ao Tarrafal, em Cabo Verde, a primeira leva de 152 presos, inaugurando assim este campo de concentração do fascismo português que iria ter duas fases: até 1954 para os anti-fascistas portugueses e entre 1961 e 1974 para os nacionalistas africanos.
A 18 de Outubro de 1936 partiram de Lisboa os primeiros detidos, entre os quais se contavam sobretudo anarquistas e sindicalistas revolucionários, militantes da CGT, bem como alguns activistas ligados ao PCP (sobretudo da Marinha Grande), participantes no levantamento grevista e insurreccional de 18 de Janeiro de 1934, e alguns marinheiros que tinham participado na Revolta dos Marinheiros ocorrida a bordo de navios de guerra no Tejo em 8 de Setembro de 1936, em solidariedade com os republicanos espanhóis.
Na altura, os presos foram alojados em barracas de campanha, com arame farpado à volta, e em situação muito precária. Só depois começou a construção das estruturas de alvenaria que tornaram as condições de habitabilidade menos dramáticas.
Campo de tortura, com a célebre “frigideira” e as próprias condições climáticas e sanitárias adversas, logo nos primeiros anos de funcionamento foram vários os detidos que morreram devido a maltratos e doenças diversas, relacionadas com a falta de condições de higiene e salubridade.
Sempre em grande número, sobretudo na década de 1940, os anarquistas presos – a maioria como Custódio da Costa ou Acácio Tomás Aquino estiveram lá durante 16 anos – constituíram-se em Organização Libertária Prisional (1936-1952). A OLP foi fundamental para o apoio e solidariedade aos presos anarquistas, ao contacto com outras organizações de presos de outras ideologias, etc.
Dos 340 antifascistas que passaram pelo Campo do Tarrafal (conhecido entre os presos como Campo da Morte Lenta), entre 1936 e 1953, 32 encontraram ali a morte e muitos outros trouxeram doenças e sequelas infindáveis. Entre os mortos anarquistas conta-se o último coordenador da CGT, o ferroviário Mário Castelhano e o anarquista de Coimbra, Arnaldo Simões Januário. No Tarrafal, morreu também Bento Gonçalves, secretário-geral do PCP.
Mortos no Tarrafal:
- Francisco José Pereira: Marinheiro, 28 anos (Lisboa, 1909 – Tarrafal 20 de Setembro de 1937)
- Pedro de Matos Filipe: Descarregador, 32 anos (Almada, 19 de Junho de 1905 – Tarrafal, 20 de Setembro de 1937)
- Francisco Domingues Quintas: Industrial, 48 anos (Grijó, Vila Nova de Gaia, Abril de 1889 – Tarrafal, 22 de Setembro de 1937)
- Rafael Tobias Pinto da Silva: Relojoeiro, 26 anos (Lisboa, 1911 – Tarrafal 22 de Setembro de 1937)
- Augusto Costa: Operário vidreiro (Leiria, ? – Tarrafal, 22 de Setembro de 1937)
- Cândido Alves Barja: Marinheiro, 27 anos (Castro Verde, Abril de 1910 – Tarrafal, 29 (24?) de Setembro de 1937)
- Abílio Augusto Belchior: Marmorista, 40 anos (?, 1897 – Tarrafal, 29 de Outubro de 1937)
- Francisco do Nascimento Esteves: Torneiro mecânico, 24 anos (Lisboa, 1914 – Tarrafal, 21 (29?) de Janeiro de 1938)
- Arnaldo Simões Januário: Barbeiro, 41 anos (Coimbra, 1897 – Tarrafal, 27 de Março de 1938)
- Alfredo Caldeira: Pintor decorador, 30 anos (Lisboa, 1908 – Tarrafal, 1 de Dezembro de 1938)
- Fernando Alcobia: Vendedor de jornais, 24 anos (Lisboa, 1915 – Tarrafal, 19 de Dezembro de 1939)
- Jaime da Fonseca e Sousa: Impressor, 38 anos (Tondela, 1902 – Tarrafal, 7 de Julho de 1940)
- Albino António de Oliveira Coelho: Motorista, 43 anos (?, 1897 – Tarrafal, 11 de Agosto de 1940)
- Mário dos Santos Castelhano: Empregado de escritório, 44 anos (Lisboa, Maio de 1896 – Tarrafal, 12 de Outubro de 1936)
- Jacinto de Melo Faria Vilaça: Marinheiro, 26 anos (?, Maio de 1914 – Tarrafal, 3 de Janeiro de 1941)
- Casimiro Júlio Ferreira: Funileiro, 32 anos (Lisboa, 4 de Fevereiro de 1909 – Tarrafal, 24 de Setembro de 1941)
- Albino António de Oliveira de Carvalho: Comerciante, 57 anos (Póvoa do Lanhoso, 1884 – Tarrafal, 22 (23?) de Outubro de 1941)
- António Guedes de Oliveira e Silva: Motorista, 40 anos (Vila Nova de Gaia, 1 de Maio de 1901 – Tarrafal, 3 de Novembro de 1941)
- Ernesto José Ribeiro: Padeiro ou servente de pedreiro, 30 anos (Lisboa, Março de 1911 – Tarrafal, 8 de Dezembro de 1941)
- João Lopes Dinis: Canteiro, 37 anos (Sintra, 1904 – Tarrafal, 12 de Dezembro de 1941)
- Henrique Vale Domingues Fernandes: Marinheiro, 28 anos (?, Agosto de 1913 – Tarrafal, 7 de Janeiro (Julho?) de 1942)
- Bento António Gonçalves: Torneiro mecânico, 40 anos (Fiães do Rio (Montalegre), 2 de Março de 1902 – Tarrafal, 11 de Setembro de 1942)
- Damásio Martins Pereira: Operário (? – Tarrafal, 11 de Novembro de 1942)
- António de Jesus Branco: Descarregador, 36 anos (Carregosa, 25 de Dezembro de 1906 – Tarrafal, 28 de Dezembro de 1942)
- Paulo José Dias: Fogueiro marítimo, 39 anos (Lisboa, 24 de Janeiro de 1904 – Tarrafal, 13 de Janeiro de 1943)
- Joaquim Montes: Operário corticeiro, 30 anos (Almada, 11 de Setembro de 1912 – Tarrafal, 14 de Fevereiro de 1943)
- Manuel Alves dos Reis (? – Tarrafal, 11 de Junho de 1943)
- Francisco Nascimento Gomes: Condutor, 34 anos (Vila Nova de Foz Côa, 28 de Agosto de 1909 – Tarrafal, 15 de Novembro de 1943)
- Edmundo Gonçalves: 44 anos (Lisboa, Fevereiro de 1900 – Tarrafal, 13 de Junho de 1944)
- Manuel Augusto da Costa: Pedreiro (? – Tarrafal, 3 de Junho de 1945)
- Joaquim Marreiros: Marinheiro, 38 anos (Lagos, 1910 – Tarrafal, 3 de Novembro de 1948)
- António Guerra: Empregado de comércio, 35 anos (Marinha Grande, 23 de Junho de 1913 – Tarrafal, 28 de Dezembro de 1948)
Uma autêntica multidão acompanhou os restos mortais dos portugueses assassinados no campo de concentração do Tarrafal em direcção ao cemitério do Alto de S. João, em Lisboa, Fevereiro de 1978. O anarquista Acácio Tomás Aquino, entre outros, fez parte da Comissão que organizou a Homenagem Nacional aos Antifascistas Mortos no Tarrafal: