sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Mozinhos, Luanda, Angola

 

Luanda enquanto lugar de memória
A TOPONIMIA DE LUANDA NO SEC XX
No início do século XX, a Planta da Cidade de S. Paulo de Loanda, de 1900, apresenta na sua indicação das ruas e edifícios mais importantes, unicamente, cinco nomes em quimbundo, velhas designações que se mantêm de duas ruas, de um bairro e de um largo.
A planta dá-nos a conhecer a localização de um novo espaço para a população africana, o qual recebe o nome de Sanzalla dos Cabindas. O nome reflecte, possivelmente, a zona de origem das populações aí residentes, Cabinda, antigo reino do Ngoyo, Loango e Cacongo, pelo Tratado de Simulambuco de 1887 debaixo da soberania portuguesa.
No entanto, para as designações em português, uma longa lista homenagea navegadores – caso de Diogo Cão que continua sempre presente – governadores - quatro novos nomes, Álvaro Ferreira, Brito Godins e Ramada Curto, em três avenidas novas e Lourenço Possolo numa calçada - e cidadãos ilustres da terra – exemplo do jornalista negro da burguesia local Pedro Franco. Uma nota para referir o papel dos três novos governadores que figuram, agora, nas placas toponímicas: Brito Godins, que nos finais do século XIX, consegue sufocar uma revolta de antigos escravos na região de Novo Redondo, pacificando a região; Álvaro Ferreira dirige uma operação militar contra um soba do Lubango e cria o distrito da Lunda e Ramada Curto, Chefe dos Serviços de Saúde e grande impulsionador do principal Hospital da cidade, o Hospital Maria Pia e governante que deu vida às primeiras instalações telegráficas de Angola. Já Lourenço Possolo “decidiu negociar com o Rei do Congo, Henrique II (1842 – 1857), um tratado pelo qual, a troco da assistência espiritual fornecida por Portugal através do envio de Missionários, o soberano concederia a Portugal vantagens de ordem política e comercial.”
Outras designações remetem para construções ligadas à Igreja e à Misericórdia ou dão-nos indicações sobre a localização do primitivo palácio do Bispo, da cadeia, do Passeio Público, do cemitério, de um mercado de venda de peixe, do Pelourinho, da primitiva residência do Bispo. Destaca-se o Largo dos Coqueiros no sítio da antiquíssima Quitanda Ma – quoqo, já identificada na planta de 1755.
A leitura da Planta da Cidade de São Paulo de Loanda, de 1926, dá-nos a conhecer, entre ruas e bairros, somente, cinco designações em quimbundo e todas elas já presentes na toponímia de Luanda em plantas anteriores. Uma rua aparece com duas designações: em quimbundo – a Rua do Bungo- e em português – Rua Direita. A lista dos nomes em português é, porém, muito extensa, são cinquenta e um nomes. Estamos perante uma percentagem esmagadora de 91% de designações em língua portuguesa que contemplam um grupo maioritário de governadores de Angola (dezasseis), personalidades destacadas pelo seu contributo para o desenvolvimento da cidade (exemplo do concessionário do Caminho de Ferro de Luanda a Ambaca e do abastecimento de água a Luanda), o navegador Diogo Cão, o historiador Alexandre Herculano, o advogado e criador do fundo da Biblioteca de Luanda, Alfredo Troni, um aviador (Emílio de Carvalho), pela primeira vez, a Praça da República (no local onde foi anunciada à população a proclamação da República) e a Avenida Marginal. Três exploradores dos territórios de Angola e Moçambique – Álvaro Castelões, Paiva de Andrade e Serpa Pinto -, o primeiro governador de Angola - Paulo Dias de Novais - que aparece, pela primeira vez, na toponímia da capital de Angola, a nomear uma rua e uma ponte da cidade, ao lado do nome de mais cinco novos governadores: Batista de Andrade, Eduardo Costa, Guilherme Capelo, Gomes de Souza, Pedro Alexandrino. São homens que ao longo dos seus mandatos tiveram um papel considerado notável para merecerem ver o seu nome inscrito nas placas toponímicas: Batista de Andrade pelos seus feitos na submissão de povos indígenas, tendo sido condecorado com a Ordem da Torre e Espada; Eduardo Costa, destacou-se nas campanhas militares de António Enes, em Moçambique, antes de ser governador de Angola; Guilherme Capelo, como Comissário Régio, ocupou os territórios de Massabi, Cacongo e Cabinda e como governador inaugurou o abastecimento de água a Luanda e iniciou a exploração do caminho de ferro de Luanda à Funda; Gomes de Souza, com obra notável como Director do Observatório, Capitão dos portos e Provedor do Asilo e da Misericórdia de Luanda e Pedro Alexandrino, governador que teve um papel importante na repressão da escravatura, no desenvolvimento da cidade, para além de ter fundado Moçamedes, no sul de Angola.
Presentes nomes de construções ligadas à Igreja, Misericórdia, Imprensa Nacional, Câmara Municipal e instalações das forças militares. Um aspecto a reter é-nos apontado por Pepetela e remete para um conjunto de ruas no bairro da Ingombota com nomes ligados a famílias tradicionais da cidade, como Vieira Dias ou Pinto de Andrade, os quais serão todos substituídos, alguns anos mais tarde. Chegamos ao ano de 1937 e a Comissão Administrativa da Câmara de Luanda delibera no sentido de se proceder à revisão da toponímia da cidade, constituindo-se para o efeito uma comissão, composta por personalidades de várias áreas da vida da
cidade. Os seus objectivos estão definidos na “Introdução ao Roteiro da Cidade de S. Paulo de Luanda”, de 1939: “fazer um trabalho de correcção histórica”, mantendo apenas “os vultos que, quer à cidade, quer a Angola, prestaram assinalados serviços”e “assinalar na toponímia da cidade várias figuras”ainda não contempladas, pelos serviços prestados à cidade ou a Angola ou, finalmente, “figuras imortais das glórias do Império”. Porém, o trabalho desta comissão não se esgota aqui e, ainda, deixa um conjunto de nomes a dar a futuras ruas da cidade: D. João II, Brasil, Moçambique, D. Antónia Saldanha. Verifica-se na planta posterior, a de 1968, o seguimento destas recomendações. Nessa planta se constacta a existência de ruas com essas designações, sendo que D. João II e Brasil são duas das maiores avenidas, então, rasgadas em Luanda.
Em 1938, altura em que a cidade inicia um crescimento acelerado, a Planta Roteiro da Cidade de Luanda apresenta, no meio de uma extensa lista de avenidas, ruas, largos, calçadas, becos, apenas, onze nomes em quimbundo. Estas designações são todas antigas, não há atribuição de novos nomes em quimbundo, à excepção da Travessa do Quinaxixe – Kinaxixi, com o significado de pântano, charco, poça de àgua das chuvas. Convém acrescentar que certos bairros com designações em quimbundo são destruídos entre 1926 e a data desta planta. Estão nesta situação os bairros dos Cabindas, Quitanda e Sangamdombe. O Burity (da família tradicional Burity que vê o seu chefe preso) cede as terras para a construção do Bairro Operário.
Na zona das Ingombotas, sucedem-se mudanças de designações com nomes de famílias locais, assimilados como Vieira Dias, Álvaro Franco e Pinto de Andrade ou outros cidadãos, caso do comerciante e vereador da Câmara Municipal Gregório Ferreira, os quais cedem o seu lugar na toponímia a figuras nacionais, como o navegador Bartolomeu Dias ou o poeta Luís de Camões. Na Cidade Baixa, também, o nome do advogado assimilado Pinheiro Falcão é substituído pelo nome do Infante D. Henrique numa importante praça da Cidade Baixa. A antiga Rua das Pretas muda a sua designação e passa a ostentar o nome do governador do século XVIII, D. António Álvares da Cunha, o Conde da Cunha. Este governador fundou quartéis de cavalaria e infantaria em Luanda e tentou resolver o problema de abastecimento de água à cidade, canalizando-a a partir do rio Bengo. No entanto, se os nomes ligados às famílias locais são substituídos, aparece-nos um Bairro Indígena e mantém-se a referência a uma antiga família da burguesia africana, no Beco do Braga.
Em português temos, assim, uma longa lista de setenta designações, na sua maioria com os heróis da História de Portugal, onde não falta D. Afonso Henriques, o “Fundador da Nacionalidade” ou alguns governadores do território e vereadores da Câmara Municipal de Luanda, exploradores do sertão africano, estudiosos da flora angolana, navegadores, ministros da Marinha e do Ultramar, sacerdotes e missionários e algumas designações ligadas a instituições religiosas. Se nos detivermos em cada um destes grupos, vemos que quatro novos governadores de Angola figuram na toponímia da cidade: Massano de Amorim, com reconhecimento pela sua campanha militar no Bailundo, Tavares de Carvalho, que, também, desempenhou funções de director dos Serviços de Fazenda e Aduaneiros; Ramada Curto, que se destacou na área da saúde, como Director dos respectivos serviços e grande impulsionador das obras do Hospital Maria Pia e Alves Roçadas, militar com várias campanhas no sul de Angola sua folha de serviço e que desenhou uma planta da cidade, em 1900. Se o governador Massano de Amorim dá o seu nome à avenida da ilha os outros três governantes nomeiam ruas da cidade continental. Os vereadores do município Jaime Amorim e Castelo Branco nomeiam duas ruas. Salazar e o Marechal Gomes da Costa, assim como a data de 28 de Maio aparecem nesta planta da cidade de 1938: os dois políticos numa avenida e no largo da ilha de Luanda e a evocação da data do golpe de Estado da ditadura no bairro central da Maianga. Sidónio Pais é lembrado numa rua. Políticos do período monárquico continuam presentes: Sá da Bandeira, Pinheiro Chagas o Conselheiro Aires de Ornelas e Neves Ferreira, Ministro da Marinha e do Ultramar que inicia a ocupação da zona do Moxico . Se os políticos de várias épocas da História de Portugal estão representados, também, dois dignitários religiosos: Simão de Mascarenhas, também governador, o missionário António Barroso e o cónego Matias (Delgado). No campo das personalidades com obra a favor do desenvolvimento da cidade figuram nesta planta da cidade os nomes dos Engenheiros Artur Torres e Costa Simão, do chefe da Repartição técnica das Obras Públicas, João Seco e do Presidente da Associação Comercial de Luanda, Farinha Leitão. Os navegadores Vasco da Gama e Fernão de Magalhães não são esquecidos. No domínio da ciência, se o matemático Pedro Nunes é escolhido, a seu lado estão os naturalistas que estudam a flora angolana – Barbosa du Bocage, Luís Carriço, o Conde de Ficalho e o austríaco Frederico Welwitsch, cujo nome baptizou a planta por si encontrada no deserto de Moçamedes, a Welwitschia
mirabilis.
Os heróis da ocupação do interior de Angola e Moçambique estão representados pelas figuras de António Enes, Mouzinho de Albuquerque e Baltazar de Aragão . O papel de Duarte Lopes, verdadeiro iniciador das grandes viagens de exploração que permitiram o conhecimento do Congo e regiões circunvizinhas é, igualmente, reconhecido. A cidade, também, não esquece os heróis anónimos da Restauração de Angola, assim como os combatentes da Grande Guerra e presta homenagem aos Lusíadas numa praça, anteriormente de Leonardo Carneiro. A Rua Direita, por sua vez, continua presente na toponímia de Luanda. A Avenida de ligação ao aeroporto da cidade e bairros limítrofes recebe o nome da capital do império, é a Avenida de Lisboa. A Calçada Baltazar de Aragão era a antiga Calçada dos Enforcados.
Temos uma percentagem de, aproximadamente, 87% de designações em português, o que mostra a forma como o poder colonial vai afeiçoando o espaço urbano às memórias e à cultura portuguesa.
( segue “O Regulamento de 1965” )
63 partilhas
Gosto
Comentar
Partilhar

Luanda enquanto lugar de memória
A TOPONIMIA DE LUANDA NO SEC XX
No início do século XX, a Planta da Cidade de S. Paulo de Loanda, de 1900, apresenta na sua indicação das ruas e edifícios mais importantes, unicamente, cinco nomes em quimbundo, velhas designações que se mantêm de duas ruas, de um bairro e de um largo.
A planta dá-nos a conhecer a localização de um novo espaço para a população africana, o qual recebe o nome de Sanzalla dos Cabindas. O nome reflecte, possivelmente, a zona de origem das populações aí residentes, Cabinda, antigo reino do Ngoyo, Loango e Cacongo, pelo Tratado de Simulambuco de 1887 debaixo da soberania portuguesa.
No entanto, para as designações em português, uma longa lista homenagea navegadores – caso de Diogo Cão que continua sempre presente – governadores - quatro novos nomes, Álvaro Ferreira, Brito Godins e Ramada Curto, em três avenidas novas e Lourenço Possolo numa calçada - e cidadãos ilustres da terra – exemplo do jornalista negro da burguesia local Pedro Franco. Uma nota para referir o papel dos três novos governadores que figuram, agora, nas placas toponímicas: Brito Godins, que nos finais do século XIX, consegue sufocar uma revolta de antigos escravos na região de Novo Redondo, pacificando a região; Álvaro Ferreira dirige uma operação militar contra um soba do Lubango e cria o distrito da Lunda e Ramada Curto, Chefe dos Serviços de Saúde e grande impulsionador do principal Hospital da cidade, o Hospital Maria Pia e governante que deu vida às primeiras instalações telegráficas de Angola. Já Lourenço Possolo “decidiu negociar com o Rei do Congo, Henrique II (1842 – 1857), um tratado pelo qual, a troco da assistência espiritual fornecida por Portugal através do envio de Missionários, o soberano concederia a Portugal vantagens de ordem política e comercial.”
Outras designações remetem para construções ligadas à Igreja e à Misericórdia ou dão-nos indicações sobre a localização do primitivo palácio do Bispo, da cadeia, do Passeio Público, do cemitério, de um mercado de venda de peixe, do Pelourinho, da primitiva residência do Bispo. Destaca-se o Largo dos Coqueiros no sítio da antiquíssima Quitanda Ma – quoqo, já identificada na planta de 1755.
A leitura da Planta da Cidade de São Paulo de Loanda, de 1926, dá-nos a conhecer, entre ruas e bairros, somente, cinco designações em quimbundo e todas elas já presentes na toponímia de Luanda em plantas anteriores. Uma rua aparece com duas designações: em quimbundo – a Rua do Bungo- e em português – Rua Direita. A lista dos nomes em português é, porém, muito extensa, são cinquenta e um nomes. Estamos perante uma percentagem esmagadora de 91% de designações em língua portuguesa que contemplam um grupo maioritário de governadores de Angola (dezasseis), personalidades destacadas pelo seu contributo para o desenvolvimento da cidade (exemplo do concessionário do Caminho de Ferro de Luanda a Ambaca e do abastecimento de água a Luanda), o navegador Diogo Cão, o historiador Alexandre Herculano, o advogado e criador do fundo da Biblioteca de Luanda, Alfredo Troni, um aviador (Emílio de Carvalho), pela primeira vez, a Praça da República (no local onde foi anunciada à população a proclamação da República) e a Avenida Marginal. Três exploradores dos territórios de Angola e Moçambique – Álvaro Castelões, Paiva de Andrade e Serpa Pinto -, o primeiro governador de Angola - Paulo Dias de Novais - que aparece, pela primeira vez, na toponímia da capital de Angola, a nomear uma rua e uma ponte da cidade, ao lado do nome de mais cinco novos governadores: Batista de Andrade, Eduardo Costa, Guilherme Capelo, Gomes de Souza, Pedro Alexandrino. São homens que ao longo dos seus mandatos tiveram um papel considerado notável para merecerem ver o seu nome inscrito nas placas toponímicas: Batista de Andrade pelos seus feitos na submissão de povos indígenas, tendo sido condecorado com a Ordem da Torre e Espada; Eduardo Costa, destacou-se nas campanhas militares de António Enes, em Moçambique, antes de ser governador de Angola; Guilherme Capelo, como Comissário Régio, ocupou os territórios de Massabi, Cacongo e Cabinda e como governador inaugurou o abastecimento de água a Luanda e iniciou a exploração do caminho de ferro de Luanda à Funda; Gomes de Souza, com obra notável como Director do Observatório, Capitão dos portos e Provedor do Asilo e da Misericórdia de Luanda e Pedro Alexandrino, governador que teve um papel importante na repressão da escravatura, no desenvolvimento da cidade, para além de ter fundado Moçamedes, no sul de Angola.
Presentes nomes de construções ligadas à Igreja, Misericórdia, Imprensa Nacional, Câmara Municipal e instalações das forças militares. Um aspecto a reter é-nos apontado por Pepetela e remete para um conjunto de ruas no bairro da Ingombota com nomes ligados a famílias tradicionais da cidade, como Vieira Dias ou Pinto de Andrade, os quais serão todos substituídos, alguns anos mais tarde. Chegamos ao ano de 1937 e a Comissão Administrativa da Câmara de Luanda delibera no sentido de se proceder à revisão da toponímia da cidade, constituindo-se para o efeito uma comissão, composta por personalidades de várias áreas da vida da
cidade. Os seus objectivos estão definidos na “Introdução ao Roteiro da Cidade de S. Paulo de Luanda”, de 1939: “fazer um trabalho de correcção histórica”, mantendo apenas “os vultos que, quer à cidade, quer a Angola, prestaram assinalados serviços”e “assinalar na toponímia da cidade várias figuras”ainda não contempladas, pelos serviços prestados à cidade ou a Angola ou, finalmente, “figuras imortais das glórias do Império”. Porém, o trabalho desta comissão não se esgota aqui e, ainda, deixa um conjunto de nomes a dar a futuras ruas da cidade: D. João II, Brasil, Moçambique, D. Antónia Saldanha. Verifica-se na planta posterior, a de 1968, o seguimento destas recomendações. Nessa planta se constacta a existência de ruas com essas designações, sendo que D. João II e Brasil são duas das maiores avenidas, então, rasgadas em Luanda.
Em 1938, altura em que a cidade inicia um crescimento acelerado, a Planta Roteiro da Cidade de Luanda apresenta, no meio de uma extensa lista de avenidas, ruas, largos, calçadas, becos, apenas, onze nomes em quimbundo. Estas designações são todas antigas, não há atribuição de novos nomes em quimbundo, à excepção da Travessa do Quinaxixe – Kinaxixi, com o significado de pântano, charco, poça de àgua das chuvas. Convém acrescentar que certos bairros com designações em quimbundo são destruídos entre 1926 e a data desta planta. Estão nesta situação os bairros dos Cabindas, Quitanda e Sangamdombe. O Burity (da família tradicional Burity que vê o seu chefe preso) cede as terras para a construção do Bairro Operário.
Na zona das Ingombotas, sucedem-se mudanças de designações com nomes de famílias locais, assimilados como Vieira Dias, Álvaro Franco e Pinto de Andrade ou outros cidadãos, caso do comerciante e vereador da Câmara Municipal Gregório Ferreira, os quais cedem o seu lugar na toponímia a figuras nacionais, como o navegador Bartolomeu Dias ou o poeta Luís de Camões. Na Cidade Baixa, também, o nome do advogado assimilado Pinheiro Falcão é substituído pelo nome do Infante D. Henrique numa importante praça da Cidade Baixa. A antiga Rua das Pretas muda a sua designação e passa a ostentar o nome do governador do século XVIII, D. António Álvares da Cunha, o Conde da Cunha. Este governador fundou quartéis de cavalaria e infantaria em Luanda e tentou resolver o problema de abastecimento de água à cidade, canalizando-a a partir do rio Bengo. No entanto, se os nomes ligados às famílias locais são substituídos, aparece-nos um Bairro Indígena e mantém-se a referência a uma antiga família da burguesia africana, no Beco do Braga.
Em português temos, assim, uma longa lista de setenta designações, na sua maioria com os heróis da História de Portugal, onde não falta D. Afonso Henriques, o “Fundador da Nacionalidade” ou alguns governadores do território e vereadores da Câmara Municipal de Luanda, exploradores do sertão africano, estudiosos da flora angolana, navegadores, ministros da Marinha e do Ultramar, sacerdotes e missionários e algumas designações ligadas a instituições religiosas. Se nos detivermos em cada um destes grupos, vemos que quatro novos governadores de Angola figuram na toponímia da cidade: Massano de Amorim, com reconhecimento pela sua campanha militar no Bailundo, Tavares de Carvalho, que, também, desempenhou funções de director dos Serviços de Fazenda e Aduaneiros; Ramada Curto, que se destacou na área da saúde, como Director dos respectivos serviços e grande impulsionador das obras do Hospital Maria Pia e Alves Roçadas, militar com várias campanhas no sul de Angola sua folha de serviço e que desenhou uma planta da cidade, em 1900. Se o governador Massano de Amorim dá o seu nome à avenida da ilha os outros três governantes nomeiam ruas da cidade continental. Os vereadores do município Jaime Amorim e Castelo Branco nomeiam duas ruas. Salazar e o Marechal Gomes da Costa, assim como a data de 28 de Maio aparecem nesta planta da cidade de 1938: os dois políticos numa avenida e no largo da ilha de Luanda e a evocação da data do golpe de Estado da ditadura no bairro central da Maianga. Sidónio Pais é lembrado numa rua. Políticos do período monárquico continuam presentes: Sá da Bandeira, Pinheiro Chagas o Conselheiro Aires de Ornelas e Neves Ferreira, Ministro da Marinha e do Ultramar que inicia a ocupação da zona do Moxico . Se os políticos de várias épocas da História de Portugal estão representados, também, dois dignitários religiosos: Simão de Mascarenhas, também governador, o missionário António Barroso e o cónego Matias (Delgado). No campo das personalidades com obra a favor do desenvolvimento da cidade figuram nesta planta da cidade os nomes dos Engenheiros Artur Torres e Costa Simão, do chefe da Repartição técnica das Obras Públicas, João Seco e do Presidente da Associação Comercial de Luanda, Farinha Leitão. Os navegadores Vasco da Gama e Fernão de Magalhães não são esquecidos. No domínio da ciência, se o matemático Pedro Nunes é escolhido, a seu lado estão os naturalistas que estudam a flora angolana – Barbosa du Bocage, Luís Carriço, o Conde de Ficalho e o austríaco Frederico Welwitsch, cujo nome baptizou a planta por si encontrada no deserto de Moçamedes, a Welwitschia
mirabilis.
Os heróis da ocupação do interior de Angola e Moçambique estão representados pelas figuras de António Enes, Mouzinho de Albuquerque e Baltazar de Aragão . O papel de Duarte Lopes, verdadeiro iniciador das grandes viagens de exploração que permitiram o conhecimento do Congo e regiões circunvizinhas é, igualmente, reconhecido. A cidade, também, não esquece os heróis anónimos da Restauração de Angola, assim como os combatentes da Grande Guerra e presta homenagem aos Lusíadas numa praça, anteriormente de Leonardo Carneiro. A Rua Direita, por sua vez, continua presente na toponímia de Luanda. A Avenida de ligação ao aeroporto da cidade e bairros limítrofes recebe o nome da capital do império, é a Avenida de Lisboa. A Calçada Baltazar de Aragão era a antiga Calçada dos Enforcados.
Temos uma percentagem de, aproximadamente, 87% de designações em português, o que mostra a forma como o poder colonial vai afeiçoando o espaço urbano às memórias e à cultura portuguesa.
( segue “O Regulamento de 1965” )

63 partilhas
Gosto
Comentar
Partilhar

Sem comentários:

Enviar um comentário