Inapagável
REPARE-SE na viril alegria destes valentes soldados portugueses que, fazendo confluir as suas miras para o mesmo alvo, posam para uma objectiva que os poderá eternizar (*). Provavelmente nem sabiam que também existe o Panteão da Infâmia, onde o nosso Presidente e as mais altas figuras do poder civil e militar podem ir, discretamente, prestar homenagens podres a um cadáver fardado e hipermedalhado.
O que essa fria e inumana objectiva capta, logo em primeiro plano, é o corpo em chamas de um guerrilheiro nacionalista que os nossos garbosos militares capturaram e, triunfalmente, decidiram queimar vivo.
A verdade é que, apesar de tudo, não foram tão insanos como aquele “comando” e ex-“flecha” guineense de etnia papel que atingia o clímax da sua moderna e patriótica “portugalidade”, sempre que podia mostrar o seu talento de capador definitivo, cortando os testículos a um irmão de cor e da futura pátria. Metia-lhos a seguir na boca, para ficar a vê-lo morrer devagarinho.
Deve ter pensado que o fogo mata muito mais depressa, diminuindo inaceitavelmente o tempo que o supliciado tem para sofrer. Talvez por isso, não desperdiçou nunca a oportunidade de saborear os gemidos da presa e aplaudir a lentidão do sangue que ia saindo da raiz de um pénis já sem função respeitável.
Soubemos do recente funeral desse monstro por notícias envergonhadas. E essa vergonha salpicou-nos a todos a consciência, de forma inapagável,
A mim, por inesperada sorte, confortou-me a surpreendente coragem do ministro da Defesa que, apesar de pastorear militares, não se intimidou e respondeu aos deputados da “portugalidade”, naquela vergonhosa audição parlamentar que lhe impuseram, não ter dificuldade em retomar a sua condição plena de cidadão. Respeitando, ao mesmo tempo, os princípios do Estado de Direito democrático.
Provavelmente, o Dr. João Gomes Cravinho tinha conhecimento, tal como os outros governantes da comitiva fúnebre, pelo menos de um rol abreviado de massacres em que está Pidjiguiti (1959), Viqueque, (1959), Mueda (1960), Baixa do Casanje (1961), Wiriamu e mais quatro aldeias (1972), Batepá (1953), musseques de Luanda (1961) e contramassacres do Norte de Angola. Em menor escala, mas em muito maior número, foram as cruéis acções violentas contra populações indefesas perpetradas por militares e milícias coloniais nos nossos vietnames. De algumas fui eu testemunha.
(*) Esta imagem é apenas parte de uma larga fotografia reproduzida pelo “Público”, 14.3.2021) e que é uma das quatro anexadas a um ofício da PIDE.
Angola, 1964 – Primeiro foram os 500 anos da ocupação, depois foram as inúmeras violências de todo o tipo, a maior das quais foi o analfabetismo e a paragem no tempo impostos aos povos indígenas, depois foi o tráfico esclavagista, depois foi o massacre da Baixa do Cassanje, depois foi a resposta sangrenta da UPA a esse morticínio, depois houve a contra-resposta ainda mais sangrenta dos colonos armados e, por fim, a Guerra Colonial com momentos exemplares como os desta imagem. Salazar, naquela sua voz de mezzo-soprano, impôs: “Para Angola, rapidamente e em força.” O resultado foi proliferarem nas cidades e nas matas, Marcelos e Marcelinos. Todos “orgulhosamente sós”, felizmente.
Moedas… valem o que vale e há muitas… mas tem dois lados… e da razão principal escondida da sua proposta… é de criar um novo impulso à direita pelo feriado em 25 de novembro e das suas comemorações!
- A intenção é homenagear o herói do 25 de novembro em Portugal
E do genocídio feito pelas tropas portuguesas em Wiriyamu - Moçambique a 19 de dezembro de 1972!
A Guerra Colonial
Em 1953, Jaime Neves entrou para a escola do exército e realizou uma comissão de serviço no antigo Estado Português da Índia entre os anos de 1958 a 1960.
Em finais de 1960, a União Indiana, já independente da Inglaterra... desde 1947, declarou guerra Portugal e afundou o navio de guerra português Afonso de Albuquerque e invadiu as antigas possessões portuguesas de Goa, Damão e Diu, integrando-as na Índia... de que faziam parte.
Entretanto com a expulsão de Portugal da Índia, Jaime Neves foi destacado para África, onde cumpriu quatro missões: duas em Angola e duas em Moçambique. Tirou o Curso de Comandos no Centro de Instrução de Comandos de Luanda. E em 1965 dirige a 2.ª Companhia de Comandos, inicialmente no norte de Angola e posteriormente em Moçambique.
Em plena Guerra Colonial 1971, Jaime Neves assume a direcção do Batalhão de Comandos de Montepuez, que reúne todas as Companhias de Comandos portugueses em Moçambique, tornando-se responsável máximo por dois mil e quinhentos soldados, que dirige por rádio e na frente de combate através de helicóptero. É nesse contexto que as tropas de Jaime Neves executam o bárbaro e sanguinário Massacre de Wiriyamu, denunciado na época nas Nações Unidas e na imprensa internacional, dando conta de que os comandos portugueses às suas ordens assassinaram indiscriminadamente pelo menos 380 civis de todas as idades, violaram mulheres e degolaram crianças. Homens, mulheres e crianças foram comprovadamente queimadas vivas.
“O músico José Afonso na sua canção - O País Vai de Carrinho também conhecida como - Os Meninos Nazis, do disco - Como se Fora Seu Filho de 1983, refere o nome de Jaime Neves quando faz referência aos crimes de guerra cometidos pelo exército português na Guerra Colonial, nomeadamente em Wiriyamu, Mocumbura e Marracuene.”
Já depois do 25 de abril, Jaime Neves irá a Moçambique, pela última vez, com a missão de impor a rendição de duas Companhias de Comandos que, e… mesmo após a revolução e o fim da guerra, se negavam a terminar o combater e assassinar independentistas moçambicanos contra as ordens de Portugal depois de abril.
Jaime Neves colocou fim à insurreição destas duas companhias, a 20-43 e a 20-45, garantindo aos militares revoltosos envolvidos nos massacres, de que nenhum deles seria detido e julgado em Portugal, nem castigado pelos crimes cometidos em África… o que aconteceu, graças ao golpe do 25 de novembro!
O episódio sangrento aconteceu em 16 de dezembro de 1972, depois de dois capitães, comandantes de companhia, morrerem dentro de um jipe que pisou uma mina anti-carro. Pelo menos 385 pessoas foram assassinadas pela 6.ª Companhia de Comandos de Moçambique, sem contar os que morreram durante a "limpeza" do local, que ocorreu nos três dias seguintes ou devido aos interrogatórios que se seguiram. O massacre ocorreu no contexto da guerra pela independência de Moçambique, quando as forças portuguesas pretendiam acabar com a presença da FRELIMO perto da cidade de Tete e da Barragem de Cahora Bassa, que estava em construção — elementos da FRELIMO declararam que iriam impedir a sua construção.
As tropas dos comandos portugueses de Jaime Neves, dizimaram um terço dos 1350 habitantes de cinco povoações (Wiriyamu, Djemusse, Riachu, Juawu e Chaworha) integradas numa área chamada de "triângulo de Wiriyamu", afectando um total 216 famílias em quarenta povoações. A chamada Operação Marosca foi instigada pela PIDE, e guiada pelo agente Chico Kachavi, que foi assassinado mais tarde, enquanto o massacre era investigado. Os soldados foram instruídos por Kachavi de que "a ordem é para matar todos", sem se importar se havia civis, mulheres ou crianças.
Jaime Neves, foi o principal comandante das forças operacionais a partir dos comandos do golpe do 25 de novembro em 1975.
Quando foi promovido pela direita portuguesa a oficial-general, o capitão de abril, Vasco Lourenço e presidente da Associação 25 de abril disse.
“Como presidente da Associação 25 de Abril, em declarações ao Expresso, que "o curriculum militar de Jaime Neves não o justifica", considerando que a promoção só se entende se "quiserem refundir Abril, substituindo Salgueiro Maia por Jaime Neves. Estão a hostilizar e a ofender profundamente os militares de Abril e o próprio 25 de Abril", conclui.
No actual contexto do avanço do fascismo na Europa a ocidente, é uma ideia força de fazer avançar esse processo de fascização em curso também em Portugal, e que melhor data senão o 25 de novembro por oposição ao 25 de abril - Uma data fracturante da sociedade e dos militares e democratas… os justos do MFA, que libertaram o povo português em abril e fizeram as pazes com a África e… os africanos, limpando a imagem de Portugal… senão poderia ter havido um banho de sangue de vingança contra os portugueses naturais e residentes em África
- E... ser uma evidente intenção da recuperação dos valores do fascismo e do colonialismo português com marcas de violência e sangue dos crimes associados a Portugal, cometidos durante o fascismo e a guerra colonial, de triste memória!
António Jorge - editor
Porto e Luanda
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